sábado, 25 de maio de 2013

LIXO EMBAIXO DA PONTE
(Sob a ponte da Penha, que atravessa a linha do trem em 28/10/05)

A imagem devia ser agradável
Afinal há vida, movimento,
Panos e roupas no varal,
Tudo em crescimento.
Mas a vida é um rio lento
Arrastando viventes.
Rio sujo, pesado, agourento.
Juntando tudo, causando enchentes...
São casas, famílias, pessoas,
Jovens, cães e crianças nuas.
Cores misturadas.
Papel, pau, coisas quebradas,
Sem projetos e infra-estrutura,
Sem rostos amontoados,
Humanos encurralados,
Infecção sem cura.

Em cima os carros passam,
Pessoas dirigem, olham.
Alguns ficam chocados,
Outros acostumados.
Mas o quê e como fazer
Pra mudar essa confusão?
Será que o poder público não vê
Ou quer apenas a manutenção
Do lixo embaixo da ponte?


Lixo vivo, lixo gente,
Que come, vota, sente,
E continua jogado no monte.

Até quando vai ser assim?
A miséria incomoda só a mim
Ou não percebo a estética
Contida na falta de ética
Na falta de dignidade
Chamada de liberdade?
Liberdade de ir, vir e morar,
Não onde quiser,
Mas onde der
Pra chegar e ficar,
Virando apenas isso.
Ficando parecido com lixo

Que se acumula embaixo da ponte.
Amor Platônico

Sem querer o encontro na rua.
Aquela que jamais passaria
Se não fosse por você.
Surpresa,
Sorriso,
Cumprimento...

O toque dos milhões de células
Das suas mãos tocando as minhas,
Provocam múltiplas sensações
Indescritíveis e prazerosas,

Um beijo no rosto.
A proximidade dos corpos.
A emoção de estarmos em público...
Vivo um instante de êxtase particular.
Palavras comuns
Com significação só minha.

Faço o meu tempo,
Não tenho pressa de nada,
Vivo intensamente
Os milésimos de segundos
Que se sucedem,
Fico ao seu lado por um instante,
Estou com você,

Mesmo que esteja distante.
ENCONTRO DE MÃOS

Suas mãos quentes transpiram
Ao procurar pelas minhas,
Quase sempre frias,
Que se entregam às suas
Como uma virgem
Em sua primeira noite de amor.

 Seus dedos laçam,
Enlaçam e entrelaçam os meus
Como num abraço
De tantos braços
Que me tiram o ar.

A transcendência deste sentimento,
Deste carinho.
A mais ninguém interessa
E é por isso que é tão pleno
Estar ao seu lado e me entregar

Neste encontro de mãos.

terça-feira, 21 de maio de 2013


Nuvens

Nuvens...
Queria andar sobre elas.
As pessoas formigavelmente  minúsculas,
As árvores, brócolis.
Lagos de furos que deixam ver o céu.
E arranha céus que não arranham nada.

Nuvens...
Algodões voadores,
Tão lentos, às vezes,
Que me parecem meses
Procurando formas.

Nuvens...
Que os ventos enlaçam,
Meus pés não alcançam,
Que o sol incide
E minha cabeça reside.


BALANÇO

O que conquistei nestes anos todos?
Muita coisa... Nada, para dizer a verdade.
Quis a família perfeita, como num comercial de margarina.
Quis coisas normais como acordar ao lado do amor da minha vida e tomar café com os filhos na mesa do jardim num dia de sol....
Quis ficar velhinha ao lado dele, pegando na sua mão e ele pegando na minha.
Quis casa própria, carro, profissão...
Larguei a casa, entreguei o carro e anseio a aposentadoria.
Separei do marido, ele não era o amor da minha vida, e a falta de coragem me impediu de resolver as coisas.
Saí de casa e agora pago aluguel.
Não dirijo mais e estou cansada de ensinar o que eu mesma não acredito.
Tenho um monte de dívidas e muitas delas são comigo mesma.
O banco cobra, a vida cobra...
E eu, cobra, sem pés e mãos para correr atrás dos sonhos.
Que sonhos?
Me falta sonhar, acreditar em alguma coisa.
Olha no que me tornei....
Naquela pessoa chata que eu criticava quando jovem.
Mal sabia eu o que ela já havia passado....
Agora que sei, não adianta mais...
Tenho menos tempo na terra do que já vivi por aqui.
Tenho menos força nos braços e menos confiança no futuro.
Triste... Muito triste perceber que a vida é só um tempo perdido entre o nascer e o morrer...


CINQUENTENÁRIA

Essa cara cheia de rugas,
Essa fala cheia de fugas,
Não é minha.
Esse corpo cheio de volume,
Que impede que me arrume,
Não é o meu.
Esse cansaço ao subir a escada,
E sentir a perna pesada,
Não me pertence.
A preguiça que me abraça
E não me deixa fazer graça,
Não morava comigo.
O sono contundente,
Que invade a gente
E me abate durante o filme
Jamais foi meu companheiro.
Esse sossego que me parece confortável
Já me chamou de incontrolável.
Essa minha quietude
Em que se transformou a atitude
Não estava em meus planos
Fiquei assim com o passar dos anos


PARTE DA VIDA

Conhecer alguém,
Querer agradar,
Ficar bonita.
Exibir,
Apresentar,
Orgulhar-se...
Fazer planos,
Desenhar futuros,
Escolher nomes,
Conhecer família.
Querer amar pra sempre,
 Ficar velhinhos
Lado a lado...
E depois
Morrer de ciúme,
Sofrer de amor,
Sentir a falta,
Chorar de saudade...


FALTA

Falta emoção,
Frio na barriga,
Adrenalina
Que acelera o coração.
Falta a risada,
Com ou sem piada,
Jogar conversa fora
Sem pensar na hora.
Falta pegar na mão,
Beijar a boca,
Um “quê” de louca
Um tanto de tesão...
Tudo está sem graça,
Não importa o que se faça.
E essa coisa insossa
De não ser mais moça
Penaliza a gente,
Parece dor de dente,
Incomoda só quem sente.
Falta leveza,
Vigor, beleza,
Coisas que não tenho mais,
O tempo passou
E eu fiquei pra trás
Sem gosto, sem gás,
Só falta escrever
Aqui jaz...

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Crônica


SINAL VERMELHO. CUIDADO!

Amo dirigir. Gosto de ir onde quero sem precisar de ninguém.
Trabalho, levo filhos à escola, faço compras e tudo o mais sem ficar pedindo, e até implorando, para o marido me levar.
Quando saímos juntos eu nem discuto mais, ele dirige. É o homem, macho da espécie, senhor do automobilismo, fera do asfalto...
Se eu não fosse tão independente, hoje estaria com ele ao volante me levando ao cabeleireiro, reclamando e falando da pressa, da urgência, de jogar futebol com os amigos.
Farol vermelho! Odeio quando está fechado. Não faz muito tempo uma amiga foi assaltada aqui as 9 da manhã. Pelo menos sou a primeira, o carro fica mais visível e isso dificulta a abordagem de assaltante.
Enquanto penso olho pelo retrovisor e percebo um motoqueiro aproximando devagar.
Meu Deus ele vai me assaltar!
Mal consigo me mexer. Aperto o botão para subir o vidro, prendo a respiração. Chego a ouvir meu coração disparado.
Ouço batidas no vidro.
Meu Deus ele deve estar armado!
Estou apavorada e paralisada. Tudo parece estar em câmara lenta.
Sem coragem de olhar em direção ao meliante, instintivamente penso em procurar marcas que possam identificá-lo.
Mas... E se ele disparar contra mim!? Meu carro não é blindado e por mais que o vidro desvie a bala, ainda assim, o tiro vai me acertar e eu posso não sobreviver. Já me vejo no velório... Meus filhos ainda precisam de mim. Meu marido vai ficar com a minha pensão e vai arrumar outra e trazê-la minha para casa!
O rapaz de capacete reluzente levanta o visor e bate novamente no vidro com o nó do dedo maior dizendo algo que não entendo.
É melhor entregar tudo rapidamente para me salvar. Ah meu Pai, se eu sair dessa com vida prometo ser uma pessoa melhor. Eu juro.
O rapaz aponta para a porta.
Ele quer que eu abra!
Fala mais alto e mais grave.
Quer impor sua autoridade e superioridade sobre mim, pobre mulher frágil e indefesa.
Agora ouço claramente.
 “Ô senhora!”
 É assim mesmo que eles falam...
 “Ô senhora, a porta tá aberta.”
Um “Ah” escapa. Toda a tensão se esvai. Volto a respirar. Aliviada.
Olho para o rapaz que sai em velocidade assim que o farol da transversal está no amarelo.
Sinto-me envergonhada. Preciso parar de assistir aos noticiários sensacionalistas...
Bato a porta. Sigo o fluxo. O farol está verde!





 NOVAMENTE  EU
.
O que acontece comigo?
Preciso de um abrigo
Para meu coração incandescente.
Será que erro ao me entregar?
Talvez devesse mentir
Deixar de me mostrar
E ironicamente rir.
Ou quem sabe então,
Retirar-me deste mundo,
Fechar meu coração
E ficar no escuro profundo
Outras vezes, penso eu,
Devo brincar com o alheio.
Dizer “meu coração é só seu”
Enquanto a todos anseio.
Mas sei que não sou assim.
Quero chorar e rir de felicidade,
Encontrar quem goste de mim
Pra não sofrer de saudade.

Eu


EU
Indecisa e incerta
São qualidades minhas,
Deixar a porta aberta
E brincar com ervas daninhas.
Sei que, às vezes, me firo
E caem lágrimas minhas,
Lagriminhas.
Mas continuo a me buscar
Em parágrafos e incisos
Até me desmanchar
Em risos e sorrisos.
Procuro em palavras estranhas
Traduzir meu universo
E saem das entranhas
Minhas rimas e versos
Diversos,
Que me encantam
E que cantam
Suaves ao meu ouvido,
Como se já tivesse vivido
Aquele zunido
Perdido,
Há muito já vivido
E agora desejado
Como um cavalo alado
Em noite de lua cheia
Fazendo sombra na areia
E correndo em minha veia.

meu ursinho


MEU URSINHO

Quero música de realejo,
Luzes coloridas,
Gosto de maçã do amor
E algodão doce.
Quero a sensação alucinante
De rodar vendo sorrisos em volta.
Quero roda gigante,
Montanha russa
E o medo prazeroso
Da paixão.
Quero carrossel iluminado,
Tentáculos de polvo me segurando.
Trem fantasma com o ciúme atormentando...
Argolas da sorte, tiros de rolhas,
Roleta colorida e bolinhas numeradas.
Tudo pra ganhar você
E levar o prêmio pra casa.
Brincar quando tiver vontade.
Abraçar, apertar
E pôr no canto da cama
Pra cuidar do meu sono.